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Porque atirei com a toalha ao chão

Um mês depois de ter parado toda e qualquer actividade enquanto activista ferroviário, debrucei-me um pouco sobre o meu site pessoal, para preencher algumas lacunas. Uma delas era precisamente uma página dedicada à minha Defesa da Ferrovia.


Ao escrever de rajada uma espécie de curriculum vitae de quase 30 anos de activismo - à data em que escrevo este post tenho 39, por isso façam as vossas contas - fui-me (re)apercebendo do quão longo é já este percurso, os incríveis milestones que foram sendo marcados ao longo do caminho... e o absoluto nada que alcancei no meio desta porra, para além de gastar o meu tempo para nada.


Não consegui salvar a Linha do Tua de ser estraçalhada por uma barragem putativa, nem de ser mantida numa sombra de si mesma, mas mantida pelo menos, com um absolutamente inconsequente Plano de Imobilidade do Vale do Tua.


O capítulo que escrevi para o livro A Linha do Vale do Sabor, capítulo o qual é na verdade um estudo original e completo de reabertura integral dos 105 km da Linha do Sabor, não foi abordado por nenhum autarca ou governante. Raios, até o meu pedido dirigido à Câmara Municipal de Torre de Moncorvo para apoiarem o meu projecto de recriação virtual da Linha do Sabor foi liminarmente recusado com um desenxabido "não estamos interessados".


Poderia falar ainda dos vários debates em que participei, desde a Assembleia da República ao Porto, de Lousado a Bragança, do Fundão a Moncorvo e Vila Real, os artigos de opinião que escrevi nos jornais, as vezes em que fui para o terreno tentar salvaguardar património em risco, as dezenas de vezes em que fui ou ignorado ou antagonizado de forma retardada e gratuita por antigos autarcas ou idiotas que sem conhecimento de causa ou 5 minutos de pesquisa vaticina que reabrir estas vias é estúpido, os estudos e cálculos que publiquei, os vídeos que gravei e editei. Tudo um enorme monte de nada no que à verdadeira defesa destas vias-férreas diz respeito na prática.


As Vias Estreitas do Douro estão todas a ser transformadas em ciclovias que custam em alguns casos mais de 100 mil euros por km - 20% do custo de recuperar 1 km de ferrovia. A Linha do Tua foi alvo de obras em 2022, mas permanece encerrada sine die, sem o mais pequeno vislumbre de sair do estado de desinteresse retardado em que as autoridades estatais que a deveriam gerir a mantém, e todas as minhas tentativas de abordar a Douro Azul, a Câmara Municipal de Mirandela, e whatever the fuck is a ADRVT, caíram num saco roto segurado em cima de um poço sem fundo. A Linha do Corgo foi incluída no Plano Ferroviário Nacional para reabertura integral, e isso teve tanto impacto nas autarquias e na população local como se tivesse sido incluída em alguma lista dos mais interessantes pratos de sopa da Burkina Faso descritos pelos mais afamados chefs da Esvalbarda numa publicação de uma revista no Butão.


Mas o que realmente foi a gota de água que fez transbordar o copo, foi o completo desprezo da população local pela salvaguarda da nossa ferrovia e do nosso direito à mobilidade sustentável, na figura da Petição pela Linha do Corgo, que lancei a 31 de Janeiro último, logo depois do debate que organizei na UTAD e que foi atendido por um grande total de umas 20 pessoas. Depois de quase dois meses de intensa partilha da Petição, por vezes em grupos nas redes sociais precisamente dedicados a "entusiastas" ferroviários e com dezenas de milhares de inscritos, bem como em grupos regionais de uma linha que serve directamente 66 mil habitantes, e mesmo depois de ter sido publicitada na imprensa regional, chegamos a hoje, 19 de Abril de 2024 (a uma semana da Petição chegar aos três meses de existência), data em que finalmente esta superou a barreira das... 400 assinaturas.

Foda-se.


Não vale a pena. Simplesmente, não vale a pena. Ninguém dá um chavelho por este tema; nada. Os autarcas dos municípios e as CIM estão-se marimbando para o tema, ou proferem enormidades sobre o mesmo. Quanto aos cidadãos em geral, ou se mantêm no torpor ébrio da indiferença e dos tabus (Via Estreita não presta! Já não há carris! O meu cão leu nas estrelas que os autocarros são bons substitutos do comboio! Culpar o Cavaco e os "xuxalistas" vai trazer o comboio de volta, because of course it will! Olhem aquela foto da década de 1970 de um comboio a vapor que gira é!), ou atiram likes e "força!", genuinamente convencidos que isso faz alguma merda que seja pelo tema, porque claro que eu sou alguma espécie de Messias da Ferrovia, que sozinho vai reabrir quase 400 km de Vias Estreitas. Isto enquanto os dois minutos que levariam a assinar uma Petição são-lhes mais trabalhosos que todos os Doze Trabalhos de Hércules juntos e elevados ao quadrado - e já nem digo perguntar em quantas consultas públicas do PFN é que participaram.


Houve honrosas excepções ao longo do caminho? Houve. Bravos cidadãos resilientes, que partilharam e assinaram a Petição, que se deslocaram aos debates, que foram a acções. Sois os 0,1% contudo, que nunca na puta da vida vai adiantar para coisíssima nenhuma. O meu obrigado e o meu respeito, na mesma.


E pronto, era algo deste género que eu queria e precisava de dizer, de desabafar, da forma mais sincera e crua possível. A menos de uma semana da Revolução dos Cravos completar meio século, é a esta merda que estamos reduzidos: um povo nhonhinhas e hipócrita, que quer que as coisas apareçam feitas, sem mexer um dedo para ajudar à mudança.


Fuck off.


Ver-nos-emos por aí de novo - ou não.

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